Patrocinados

domingo, 17 de maio de 2020

Fritz Müller: o colono cientista de Santa Catarina que se correspondia com Charles Darwin

O  que você pensaria se encontrasse esse senhor da foto, senhor Fritz Müller em alguma picada de algum lugar da Colônia Alemã do vale do rio Itajaí Açu na região da futura cidade de Blumenau em Santa Catarina? Um colono. Friedrich Müller veio para o Brasil com o propósito expresso de ser colono, cultivar sua terra e viver em paz. Nativo de uma cidade com um nome meio grande, Winsdischonholzhause, o Sr Fritz Müller terminou o curso de medicina. Mas nunca exerceu a profissão. Não porque não gostasse. Mas porque na hora de receber o diploma ele tinha que fazer o juramento do médico. Tudo que ele tinha que fazer era repetir, como um papagaio, o que o mestre de cerimônia dizia.

O juramento começou: “Juro em nome de Deus ...” os formandos repetiram. Não ele. Ele não aceitou jurar em nome de Deus. Por isso ele foi tachado de ateu. Uma acusação meio perigosa naquela época, até hoje é também. Mas só duas espécies de pessoas podem não aceitar jurar em nome de Deus. O ateu consciente e o cristão igualmente consciente. Afinal, Tiago, o apóstolo, disse: “Mas, sobretudo, meus irmãos, não jureis nem pelo céu nem pela terra, nem façais qualquer outro juramento; mas que a vossa palavra seja sim, sim e não, não, para que não caiais em condenação” (Tiago 5:12) segundo a Versão Almeida Revista e Corrigida da Bíblia. No meu ver Fritz Müller estava certo. Bastariam ter-lhe perguntado: Fritz você jura ser um médico honesto?

Um dia ele chegou a Blumenau a colônia fundada pelo farmacêutico Hermann Otto von Blumenau, uma colônia de alemães, muitos dos quais excedente da mão de obra de uma Europa que começava a cercar as propriedades e expulsar os antigos trabalhadores das terras dos antigos feudos. Blumenau se dedicou muito ao estudo da situação dos alemães que tinham duas escolhas: ser mão de obra barata nas cidades que entravam no embalo da industrialização ou ir embora. Como um líder, Blumenau organizou a comunidade assegurando o menor trauma possível inclusive em assuntos religiosos. A comunidade era acima de tudo luterana. Mas e Fritz Müller com sua fama de ateu? Como se não fosse suficiente, Fritz ainda tinha o problema com a cabeça dele. Ele se interessava pela mata ao redor da colônia, com os pássaros, com os insetos, com as cobras e outro répteis. Isso garantia o respeito, a suspeita, certo distanciamento e uma admiração que sempre estão presentes nessas horas.

Dizem que  Blumenau não só incentivou como ajudou na ida do Dr. Fritz Müller para a capital de Santa Catarina que naquela época ainda se chamava Desterro. Lá ele assumiu como professor do Liceu Provincial onde permaneceu por nove anos. Um paraíso para Fritz Müller. Aquelas praias que ele podia percorrer descalço, colecionando conchinhas, seres marinhos, crustáceos era um paraíso. Empurraram o r. Fritz para o caminho da ciência brasileira.

Enquanto ele vivia, na Europa Wallace e Darwin encontraram uma maneira de publicar juntos um trabalho sobre a origem e a evolução das espécies. Darwin havia estado no Brasil duas vezes parando em Fernando de Noronha, avistando os atóis de São Pedro e Paulo, parando na Bahia e Rio de Janeiro onde outros grandes pesquisadores haviam passado. Darwin não teve lá tanto tempo para se dedicar ao estuado das coisas naturais brasileiras mas fez observações e quando saiu do Brasil, partiu desconjurando prometendo que e até jurando que nunca mais queria visitar um país de escravos. É o que a gente chama hoje de má imagem.

Mas ele nunca foi a Desterro cidade brasileira que atrairia a atenção de Charles Darwin graças a quem? Ao Dr. Fritz Müller que tinha sua terrinha em Blumenau, um emprego em Desterro e até posição de consultoria com as instituições científicas do Rio de Janeiro, capital do Império. Se Darwin não veio ao encontro de Fritz Müller, Fritz foi até ele. Não atravessando o mar para buscar um entrevista com Darwin. Mas via correspondências. Fritz contava a Darwin sobre suas observações e experiências. Darwin gostava tanto do contato que batizou Fritz de Príncipe das Observações. Finalmente, um dia, Fritz publica um livro intitulado “Für Darwin” (Para Darwin). E aquele senhor da foto que abre esta postagem, com sua humildade e carinha de gente comum, publicou o livro na Alemanha. Tente fazer isso hoje!

Observação de pássaros em Blumenau: na trilha de Fritz Müller

Com o seu trabalho Fritz corroborou com Darwin, ajudando-o a fundamentar algumas áreas da teoria da seleção e da adaptação natural de várias espécies.  Uma delas a capacidade de mimetização das espécies. Mimetização é o nome da habilidade dos animais darem uma de joão-sem-braço para não serem vistos pelos predadores que planejam almoçá-lo. O mimetismo é amplo e vai desde o mimetismo do camaleão que muda de cor, aos sapos com listas brilhantes verdes, laranja ou amarelas que são venenosos e outros que não são venenosos mas exibem exibem as cores de alerta mesmo para não serem comidos. O “Mimetismo de Fritz” foi muito demonstrado em borboletas da Mata Atlântica que ele viu em Santa Catarina tanto em Blumenau como no litoral.

Assim não tem como a vida dar errado para quem nasceu para vencer. Hoje, Fritz Müller é nome de Praça em Florianópolis além de ser o nome do filho mais ilustre de Blumenau onde os visitantes podem conhecer a Biblioteca Fritz Müller, a casa e o Museu dedicado ao homem que não precisou jurar para ser o um cidadão produtivo. O livro de Fritz Müller (1864, Für Darwin) foi traduzido para o português e publicado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com apoio do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

As Cartas trocadas entre Darwin e Fritz Müller são parte do Projeto Cartas de Darwin da Universidade de Cambridge com direito a uma espaço especial para as Cartas de Fritz Müller.

Links iniciais para o mundo de Fritz Müller:

Museu de ecologia Fritz Müller

Fundação Fritz Müller

Ecology Museum no Atlas Obscura

Para pesquisar no Google: Müllerian Mimicry, Mimestismo Mülleriano, 

Nenhum comentário:

Proposta no ar: IPG em vez de PIB

Li recentemente aqui que executivos americanos embolsaram milhões de dólares antes da crise financeira. Me lembrei de um especialista gaúch...